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Mulheres que mudaram o mundo: Sarah Bernhardt

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Sarah Bernhardt foi uma das atrizes mais conhecidas do mundo. Em uma época em que o conceito de celebridade mal começava a surgir, Bernhardt tornou-se mundialmente conhecida.

Ela revolucionou a indústria teatral e a forma como os artistas se relacionavam com a mídia. Quer saber mais sobre essa estrela fantástica? Continue a leitura.

Quem foi Sarah Bernhardt

Sarah Bernhardt foi uma atriz francesa que viveu entre o século 19 e o século 20. Ela alcançou fama mundial devido à sua carreira e ao seu trabalho.

Bernhardt é considerada a primeira celebridade da era moderna. Ao longo de sua carreira, construiu uma imagem que desafiou os papéis de gênero da época e que fascinou multidões.

Vida antes da fama

Henriette Rosine Bernard nasceu em Paris no dia 23 de outubro de 1844. Sua mãe, Julie Bernard, era judia de nacionalidade holandesa. 

Henriette, que mais tarde ficaria mundialmente conhecida como Sarah, teve duas irmãs mais jovens: Jeanne e Régine. As três meninas são filhas de pai desconhecido. 

Julie trabalhava como prostituta e preferiu que as filhas fossem educadas longe de casa. Por isso, Sarah passou os primeiros anos de vida em uma pensão. Posteriormente, a menina foi estudar em um internato católico. 

Nesta época,Sarah planejava se tornar uma freira. Entretanto, um amante de Julie, o duque de Morny, sugeriu que Sarah seguisse a carreira de atriz. Ele conseguiu uma vaga no Conservatório de Paris para que a adolescente pudesse estudar. 

Muitos professores consideraram Sarah uma jovem promissora. Mas ela acreditava que os métodos da escola eram muito conservadores e queria seguir novos caminhos. 

Em 1862, aos 18 anos, Sarah foi aceita na Comédie Française, a companhia estatal de teatro. Seu papel de estreia foi em Ifigênia, peça escrita por Racine. A atuação, porém, não fez sucesso com a crítica.

No ano seguinte, Sarah foi expulsa da companhia por ter esbofeteado outra atriz durante uma discussão. Ela logo se juntou a outro grupo de teatro, mas seu trabalho não teve muito êxito. 

Após algum tempo, Sarah se afastou do palco e passou a se questionar se deveria persistir na carreira. Neste período, ela teve um caso com um aristocrata belga e ficou grávida. 

Bernhardt decidiu que não iria desistir dos palcos. Ela logo votou a trabalhar para sustentar a si mesma e a seu filho Maurice.

Sua volta aos palcos

Em 1866, Bernhardt se uniu à companhia de teatro Odéon. Ela ficou no grupo durante seis anos de trabalho intenso e, gradualmente, foi ganhando reconhecimento. 

Seus primeiros sucessos foram nesta época. Sarah interpretou Anna Danby na peça “Kaen”, escrita por Alexandre Dumas Pai. Pouco depois, ela interpretou também a Cordelia em Rei Lear, de Shakespeare.

Mas o papel que lhe traria fama estava por vir. Em 1868, Sarah interpretou um personagem masculino em Le Passant (O Transeunte, em português), de François Coppée

Bernhardt deu vida ao personagem Zanetto, um rapaz que passa a noite em companhia de uma prostituta mais velha. Não era comum que uma mulher interpretasse papéis masculinos na época. 

Com isso, o trabalho de Sarah foi bastante comentado, tanto pela crítica quanto pelo público e a atriz ganhou notoriedade em pouco tempo.

Em 1870, teve início a Guerra Franco-Prussiana. Durante o conflito, o exército alemão cercou Paris, com objetivo de forçar a derrota dos franceses. Foi um conflito violento, que mudou a rotina da cidade.

Uma das consequências foi que o Odéon teve de fechar as portas. Havia um grande número de mortos e feridos. Sarah decidiu, então, organizar um hospital no local onde antes funcionava o teatro. 

Ela lançou mão de sua influência para obter a permissão para  funcionamento, bem como para conseguir insumos para o funcionamento do hospital. 

Em 1872, após o fim da guerra, Bernhardt retornou para a sua primeira companhia, a Comédie Française. Dessa vez, ela teve sucesso em alguns papéis pequenos e logo estreou como protagonista em “Fedra”, de Racine. 

A peça, uma tragédia em cinco atos, é considerada uma importante obra do teatro francês e o papel título é considerado bastante dramático. Sarah se saiu muito bem e foi aclamada pelo trabalho. 

Durante alguns anos, Bernhardt fez diversas performances e papéis junto à companhia. Um dos mais comentados foi a personagem Desdêmona em “Otelo”, de Shakespeare.

Seu sucesso junto aos críticos era cada vez maior. Sarah era elogiada como uma atriz expressiva e, ao mesmo tempo, capaz de grandes sutilezas dramáticas. 

O público se encantou com aspectos como a beleza física, a graciosidade de seus gestos, o carisma e a presença de palco. A voz de Sarah era considerada única e muitos elogiavam sua dicção perfeita. 

Uma mulher muito à frente de seu tempo

Para além de seu talento nos palcos, Sarah tornou-se popular por outros motivos. Sua personalidade anticonvencional e seu comportamento fora dos padrões de gênero fizeram com que sua vida fosse tão comentada quanto suas performances. 

Quando tinha 20 anos de idade, a reputação de Sarah passou a ser alvo de comentários, já que a atriz não era casada. 

Relacionamentos e vida amorosa

Ao longo da vida, ela teve diversos relacionamentos amorosos. Frequentemente esses romances eram anunciados na imprensa e acompanhados com interesse pelo público. 

Em mais de uma ocasião, houve relatos de que Sarah se envolveu com pessoas conhecidas. Algumas delas são: o escritor Victor Hugo,  os pintores Gustave Doré e Gustave Clarín, o príncipe Edward II

De acordo com os rumores, Sarah também teve relacionamentos com mulheres. O mais conhecido foi com a artista Louise Abbema

O comportamento sexual de Sarah era considerado escandaloso por desafiar os padrões morais da época. Afinal, no final do século 19 e início do século 20, esperava-se que as mulheres se casassem virgens e se dedicassem a cuidar da casa e da família. 

O casamento

Aos 38 anos, Bernard chocou algumas pessoas por se casar com um homem onze anos mais jovem, um ex-militar grego chamado Aristides Damalas. Inicialmente, ele havia sido contratado para acompanhá-la dentro e fora dos palcos durante as turnês. 

A união não foi feliz: as brigas do casal eram frequentes e Damala mantinha diversas amantes, sem se preocupar em manter a discrição.

Outro problema era o vício dele em morfina. O relacionamento entre Bernhardt e Damala chegou ao fim em pouco tempo. Mas eles permaneceram casados no papel até a morte de Damala em 1899, devido ao uso de drogas. 

Artista inspirada e inspiradora

Ao longo da carreira, Sarah serviu como musa inspiradora na literatura e nas artes. Oscar Wilde escreveu a peça Salomé para a atriz. 

Marcel Proust se inspirou em Bernard para criar a personagem Berma na saga Em Busca do Tempo Perdido. O artista Alphonse Mucha ganhou fama por retratar Sarah Bernhardt em seus cartazes em estilo art-nouveau. 

Bernhardt vivia em um ambiente culturalmente vibrante e, ao longo do tempo, explorou diferentes linguagens artísticas, como a literatura e a escultura

Um de seus trabalhos mais conhecidos é Ofélia, busto feito em mármore no ano de 1880. Apesar da fama, Bernard até então jamais havia interpretado Ofélia, uma das mais conhecidas personagens de Shakespeare

Animais e hábitos exóticos

Bernhardt tinha fascínio por animais exóticos. Ela possuía vários deles: uma jiboia, um cão de caça, um papagaio, um puma, um macaco e sete camaleões. Seu crocodilo de estimação, chamado Ali Gaga, morreu prematuramente por que Sarah gostava de lhe dar bebidas como champanhe e leite.  

Outro fato peculiar era o caixão de Sarah. Ela levava o objeto em suas turnês. Além de servir como objeto cenográfico, era comum que a atriz posasse para fotos deitada como uma falecida. 

Todas essas excentricidades não eram fruto do acaso. O dinheiro (e, consequentemente, o poder e a independência) de Sarah vinha de seu trabalho como atriz. Ela sabia muito bem que quanto maior fosse sua presença na mídia, maior seria o seu sucesso na bilheteria. 

Em uma época em que o conceito de celebridade estava começando a surgir, Bernhardt demonstrou extrema habilidade e inteligência para dominar a mídia e para utilizar a imprensa a seu favor. Não por acaso, ela é conhecida como a primeira mega celebridade do mundo.

Estrelato

Em 1880, Bernhardt fundou sua própria companhia de teatro e rodou o mundo com suas turnês. Ela se apresentou na Europa, Canadá, Estados Unidos, Brasil e Austrália, entre outros países. 

Nas turnês, ela apresentava papéis clássicos do teatro, como Fedra e Dama das Camélias. Mas também havia apresentações inovadoras: os melodramas escritos pelo dramaturgo Victorien Sardou.

Na década de 1880, Sardou escreveu e dirigiu quatro peças para Bernhardt: Fédora, Théodora, La Tosca e Cléopâtre. Mais que apresentações teatrais, as peças eram um verdadeiro espetáculo, com decorações luxuosas, figurinos exóticos e grande número de atores. 

As peças fora do comum se tornavam ainda mais atrativas para o público devido à imagem pública que Bernhardt construía de si mesma. Afinal, fora dos palcos, Sarah se mostrava como uma artista excêntrica, que levava uma vida muito fora do comum. A estratégia teve enorme sucesso: as turnês arrastavam multidões para ver as apresentações. 

Em 1893, Sarah passou a gerenciar o Théâtre de la Renaissance. Em 1899, sua companhia mudou de local e passou a ocupar o Théâtre des Nations, que recebeu o nome de Théâtre Sarah Bernhardt. O local foi administrado por Sarah até sua morte, em 1923.

Sarah no cinema

Bernhardt foi uma das primeiras personalidades a se envolver com o cinema. A primeira projeção da história ocorreu em 1895. Na época, o cinema ainda não tinha o estatuto de arte e muitas pessoas acreditavam que se tratava de uma invenção com interesse científico. 

Bernhardt apareceu em filmes pela primeira vez na Exposição Universal 1900. O evento ocorreu em Paris e tinha como objetivo apresentar descobertas e inovações, como a Torre Eiffel

O filme em que Bernhardt aparece tem cerca de um minuto e meio de duração. Nele, a atriz interpreta um famoso personagem masculino do teatro: Hamlet. Aliás, Bernhardt foi a primeira mulher a dar vida ao príncipe da Dinamarca, tanto no cinema quanto nos palcos.

Em 1912, Sarah Bernhardt estrelou seu primeiro longa-metragem, “A Dama das Camélias”. A história é baseada na peça, que leva o mesmo nome. Outro papel icônico de Sarah no cinema foi como a Rainha Elizabeth em um filme sobre a vida amorosa da monarca. 

A professora de cinema Victoria Duckett destaca que a contribuição de Bernhardt para o cinema foi de profunda importância. Além de aparecer em papéis familiares para o público que frequentava os teatros no final do século XIX, a atriz participou também de filmes que apresentavam papéis novos e originais.

Isso contribuiu para que o cinema pudesse ser percebido pelo público como uma nova linguagem artística. Duckett destaca, ainda, que há pouquíssimas pesquisas sobre como os filmes de Sarah eram desenvolvidos. Existe a possibilidade de que a atriz tenha sido responsável (total ou parcialmente) por aspectos como: roteiro, produção e direção, entre outros. 

Sarah Bernhardt no Brasil

Bernhardt veio ao Brasil em três ocasiões diferentes, todas elas para realizar apresentações: em 1886, 1893 e 1905. 

De acordo com a pesquisadora Monize Moura, a vinda de Bernhardt marcou a inserção do Brasil no panorama cultural internacional. 

Os espectadores brasileiros puderam ter acesso a apresentações que haviam sido feitas em diversos outros países. Isso ajudava a formar uma comunidade global de espectadores de teatro, fato até então inédito em nosso país. 

Moura aponta também que a vinda de Bernhardt exerceu uma forte influência no fazer teatral brasileiro e na recepção do público.

Em sua última visita ao Brasil, Sarah sofreu um acidente. Durante uma de suas peças, a atriz caiu e machucou o joelho. Com o passar dos anos, o quadro foi piorando. Dez anos depois, a atriz precisou amputar a perna.

Ainda assim, Sarah se recusou a parar suas turnês e apresentações. Em sua última turnê, que ocorreu em 1916, a atriz de 72 anos passou dezoito meses na estrada. Bernhardt faleceu em 1923, devido a uma doença renal.

22 principais obras de Sarah Bernhardt

Bernard teve uma vida longa e foi muito produtiva. Conheça alguns de seus principais trabalhos:

No teatro:

O teatro tornou Bernhardt uma estrela internacional. Ela interpretou inúmeros papéis ao longo de sua carreira. Os mais aclamados foram:

  1. Anna Danby na peça Kaen (de Alexandre Dumas Pai)
  2. Cordelia na peça Rei Lear (de William Shakespeare)
  3. Menestrel na peça O Transeunte (de François Coppée)
  4. Fedra na peça Fedra (de Racine)
  5. Desdêmona na peça Otelo (de William Shakespeare)
  6. Margueritte na peça A Dama das Camélias (de Alexandre Dumas Filho)
  7. Cleópatra na peça Cléopâtre (de Victorien Sardou)
  8. Foria na peça La Tosca (de Victorien Sardou)
  9. Hamlet na peça Hamlet (de William Shakespeare)

No cinema:

Sarah foi uma das primeiras artistas a explorar a linguagem cinematográfica. Descubra alguns de seus filmes.

  1. Le duel d’Hamlet (1900)
  2. Tosca (1908)
  3. A Dama das Camélias (1912)
  4. Os amores da Rainha Elizabeth (1912)
  5. Adrienne Lecouvreur (1913)
  6. Jeanne Doré (1915)
  7. Mères Françaises (1917)
  8. La voyante (1924)

Nas artes visuais:

Poucas pessoas sabem que Bernhardt era uma habilidosa escultora. Ela tem dois trabalhos conhecidos.

  1. Ophelia (1880)
  2. Autorretrato como Quimera (cerca de 1880)

Na literatura:

Bernhardt escreveu mais de uma autobiografia, contando diversos aspectos de sua vida dentro e fora dos palcos. Confira três deles:

  1. Eu, Sarah Bernhardt
  2. The idol of Paris
  3. My Double Life

5 livros sobre Sarah Bernhardt

Com uma personalidade fascinante, Bernhardt inspirou uma série de obras – incluindo livros de ficção e de não-ficção. Conheça alguns deles: 

  • Sarah: a vida de Sarah Bernhardt – Se concentra sobre os diversos aspectos da vida de Bernhardt. A evidência maior está nos conflitos familiares da atriz com a sua mãe, com o marido e com o filho Maurice.
  • Playing to the Gods – Aborda a rivalidade entre as atrizes Sarah e Eleonora Duse. Bernhardt e Duse tinham estilos de atuação bastante diferentes e dividiram o público da época. 
  • The First Actress: Esse livro narra a vida e a carreira de Sarah em forma de romance. Desta forma, podemos acompanhar os eventos narrados em primeira pessoa, na voz ficcional de Sarah. 
  • A gênese da sociedade do espetáculo: O livro não fala exatamente sobre Sarah Bernhardt, mas sim sobre o panorama cultural de sua época. O assunto principal é como funcionava o teatro europeu durante o século 19.
  • A perna de Sarah Bernhardt: Esse romance policial e de vampiros tem Sarah Bernhardt como uma de suas personagens principais. No início do século 20, um investigador de polícia tenta elucidar a morte de uma empregada de Bernhardt.

Por que Sarah Bernhardt é uma mulher que mudou o mundo?

A virada do século 19 para o século 20 foi uma época em que a sociedade começava a se modernizar. Inovações tecnológicas, mudança no painel cultural, novos hábitos e comportamentos faziam parte do dia a dia das pessoas. 

Apesar disso, era uma sociedade dominada pelos homens. Esperava-se que as mulheres tivessem um comportamento submisso e que ficassem limitadas aos afazeres na esfera doméstica.

Sarah Bernhardt rompeu essas expectativas em vários aspectos. Construiu uma carreira de sucesso tanto do ponto de vista artístico quanto do ponto de vista financeiro. 

No teatro, criou um estilo de atuação único que fascinou o público e que a tornou reconhecida pela crítica. Ao mesmo tempo, soube buscar e criar oportunidades de trabalho, tornando-se um nome de peso no panorama cultural de sua época.

No que diz respeito à vida pessoal, Bernhardt rompeu com diversos padrões de comportamento. Teve uma vida amorosa e sexual livre e escolheu seus parceiros de acordo com a própria vontade, sem se importar com julgamentos morais. 

Criou a imagem de uma estrela com um estilo de vida excêntrico e tão espetacular quanto as peças que estrelava. Sarah criou uma persona pública que despertava enorme interesse e, com isso, tornou-se a primeira celebridade mundial. 

Bernhardt foi também uma administradora de sucesso: criou a própria companhia de teatro e viajou o mundo. Fez diversos filmes em uma época em que o cinema apenas começava a surgir e, finalmente, teve seu próprio teatro. 

Sua escolha de papéis desafiou a heteronormatividade. Além das heroínas tradicionais, Bernhardt interpretou papéis masculinos, desafiando publicamente as expectativas sociais. 

Por fim, Sarah jamais abriu mão do controle criativo no palco, no processo de produção teatral, nos negócios e em sua imagem pública. Em uma sociedade machista e patriarcal, Bernardt se destacou não apenas pelo trabalho artístico. Mas também pela inteligência e capacidade de planejar a própria carreira. 

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